O Nome da Rosa

Adaptações cinematográficas de obras literárias nem sempre conseguem agradar tanto os que leram o livro, como também os que estão tendo o primeiro contato com a mesma através da película. Alguns filmes conseguem, com um bom roteiro adaptado, trazer para as telas o espírito, o clima, e a personalidade dos personagens presentes num bom romance. Muitas vezes, a análise de um filme adaptado deve se afastar do livro que lhe deu a inspiração. Mas não podemos deixar de criticar quando a obra cinematográfica diminui, com uma péssima adaptação, a grandiosidade e importância de uma obra literária. Mas fiquemos tranquilos, esse não é o caso de O NOME DA ROSA – Der Name der Rose (1986).

No entanto, posso confessar que o filme apresenta algumas diferenças do livro. Por isso, adianto-lhes que esse texto pretende tratar do filme não dissociado da obra literária, mas entendendo o contraste entre os dois formatos, por alguns motivos: Primeiro, que apesar das diferenças, a adaptação foi muito boa e podemos sentir muito do que o escritor passou no livro; Segundo, que muita gente não leu o livro mas assistiu o filme, outros nem leram o livro nem viram o filme, mas poderão, a partir dessa resenha, tomar contato pelo menos com este último. Portanto, meus caros amigos que leram O Nome da Rosa, vamos nos afastar dessa magnífica obra, para que sem pré – conceitos, possamos ver o valor que tem o filme.

Cumpre ressaltar que O Nome da Rosa é uma adaptação cinematográfica da obra de mesmo nome do escritor italiano Umberto Eco. O Filme conta com a co-produção de 3 países: França, Itália e Alemanha. O roteiro foi responsabilidade de Andrew Birkin, Gérard Brach, Howard Franklin e Alain Godard. A direção ficou a cargo de Jean-Jacques Annaud. Na atuação, dando peso à boa interpretação e vida aos personagens do livro temos Sean Connery, F. Murray Abraham, um jovem Christian Slater, Ron Perlman entre outros.

A história do filme se passa no ano de 1327. Um frade Franciscano, Guilherme William de Baskerville (Sean Connery), e um jovem noviço, Adso von Melk (Christian Slater), chegam a um convento da Itália para participarem de um Conclave da Igreja Católica. No entanto, uma série de mortes dos monges deste convento chama a atenção de William que passa a investigar os crimes. Existe uma preocupação imensa de que tais fatos possam obstacular o encontro do clero para os debates. Ao mesmo tempo, devido ao radicalismo religioso tradicional do período bem como ao obscurantismo da Igreja Católica, alguns monges passam acreditar que as mortes são obra do demônio prenunciando o fim do mundo. William em nenhum momento acredita nessa versão. Usando de um raciocínio lógico e de um método dedutivo de investigação ele vai afastando cada suspeita infundada e descobre que as vítimas tiveram contato com um livro do filósofo grego Aristóteles. No entanto, a chegada de Bernardo Gui (F. Murray Abraham), Grão-Inquisidor da Igreja, muda tudo já que assume as investigações e inicia uma verdadeira caça às bruxas. De repente, Salvatore (Ron Perlman), um monge deficiente mental e corcunda, torna-se o principal suspeito, junto com uma jovem camponesa que prestava favores sexuais em troca de comida no convento. Ocorre que Adso, teve um contato íntimo com esta garota, e apaixonado, tenta junto com William descobrir o criminoso para impedir que os suspeitos sejam levados à fogueira.

Notadamente se destaca no filme o suspense policial, com uma trama idêntica a muitas obras do gênero, voltado para decifração de enigmas ou crimes. Uma verdadeira história de detetives. Os personagens lembram os clássicos Sherlock Holmes e Dr. Watson. Não à toa, o personagem principal de O Nome da Rosa, William de Baskerville, tem seu sobrenome, com toda certeza, numa ligação direta ao clássico de Sir Arthur Conan Doyle, “O Cão dos Baskervilles”. O método de investigação que o personagem adota se assemelha ao usado pelo famoso detetive britânico, inclusive usando de forte dedução lógica. Apesar desse detalhe, a estória absorve elementos como a religião, filosofia, dogmas e até política, dando maior riqueza a obra, além de um aspecto ainda mais interessante: o conflito do jovem Adso com a descoberta do amor, ainda que pecaminoso, o envolve fazendo com que questione sua vocação religiosa.

O diretor Jean-Jacques Annaud não é responsável por grandes produções, talvez O Nome da Rosa seja um dos filmes de maior importância em seu currículo. Ainda assim, podemos perceber um bom trabalho na direção. A fotografia também tem seus méritos uma vez que consegue criar um clima sombrio e pesado durante todo o tempo; uma provável simbologia para caracterizar o obscurantismo da Igreja e dos monges do convento. Na atuação, Sean Connery se destaca, seu personagem é o mais importante da obra, sua responsabilidade era grande em desempenhar bem o papel, e conseguiu. Hoje não temos como imaginar um William de Baskerville diferente. Quanto a Christian Slater, não dá para se exigir muito, talvez esse tenha sido o erro do “casting”, pois Adso também era importante, e talvez pela pouca experiência do ator, não deu para perceber o peso da dualidade entre o pecado e amor que o personagem sofria no livro. Agora devo destacar Ron Perlman. O peso do personagem Salvatore na obra literária está apenas no fato de ser um dos suspeitos do crime bem como na sua própria figura, um corcunda louco e hediondo de cara deformada. Apesar do bom trabalho da maquiagem, foi a atuação de Perlman que deu personalidade a Salvatore. A loucura, os trejeitos, tudo foi tão bem composto pelo ator que dá para sentir uma boa diferença entre o livro e a obra, mas para melhor.

O roteiro, talvez intencionalmente, torna o filme célere. É claro que se nota a crítica à Igreja Católica, a eterna dualidade entre ciência/conhecimento e religião, bem como a alusão aos movimentos heréticos que houveram na época. A abordagem histórica é curta. A ênfase maior é no enredo, no desenrolar da estória, as investigações e o descobrimento do responsável pelos crimes. Não existe um aprofundamento sobre os personagens, suas origens, entre outras coisas. Trata-se de um formato diferente do que se tem no livro. É bem provável que o Cinema não permitisse a transcrição da obra literária ao “pé da letra”. Daí é natural as mudanças e a rapidez em que se transcorre os fatos.

O Nome da Rosa, como já disse antes, apesar da adaptação, é um ótimo programa e respeita o livro. É muito interessante se deparar com questões filosóficas, traçar uma reflexão sobre o bem e o mal e entender um pouco mais da questão religiosa, uma vez que traz elementos que estão diretamente ligados com as mudanças consideráveis da atualidade no palco da religião Católica. Novamente argumento para que não deixemos nos levar por pré – conceitos. É óbvio que a obra possui uma carga crítica, mas não fala de nada fora do que acontecia na época em que se passa o filme. No mais, aconselho que não deixem de ler o livro, mesmo depois de ver o filme e sabendo o final. Tenho certeza que vão se impressionar. Uma aula de história que abrirá a mente de vocês para vários temas daquela época.

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13 pensamentos sobre “O Nome da Rosa

  1. Parabéns o post ficou muito bom, uma professora minha costumava mencionar este filme como referência nas aulas de semiótica. É do tipo de filme que gosto de rever, e sempre descubro coisas novas.

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    • O Nome da Rosa, apesar de a abordagem histórica ser muito breve, serve como referência para a matéria. Muitos professores o indicam quando estão falando de Inquisição, Reforma Protestante, Idade Média etc. Obrigado pelo elogio, Ivan.

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  2. Com o filme “O Nome da Rosa” eu tive uma experiência bem diferente, pois o vi a poucos anos, depois que o “frisson” havia passado.

    E apesar dos milhares de spoleir’s colhidos durante o passar dos anos o filme ainda me surpreendeu. Elogiar o Sean Conner é obrigatório, mas a atuação de Perlman é excepcional.

    ledo
    adorei a resenha e esperamos os próximos!

    abraços,
    do King Buddy Holly, eternamente it’s Alive!

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    • Isso é uma verdade, King, pois já assisti várias vezes o filme e mesmo sabendo do final dá para curtir do mesmo jeito. Mas isso se deve ao fato de que a obra é muito boa e qu a estória, ainda que inserida num contexto do passado, é extemporânea.

      As atuações são ótimas. O elenco em si é muito bom, com raras exceções.

      Obrigado pelos elogios, e continue dando essa força para o site. Gostamos de escrever porque vocês gostam de ler.

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    • Olha aí, realmente um cast seria uma boa. Mas Alessando, se vc estiver interessado em ouvir sobre filmes e obras literárias ouça o MasmorraCast #14 – Cinema e Literatura. Mas fica aí a sugestão para um só sobre O Nome da Rosa.

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  3. Quando eu estava no 1º ano do Ensino Médio (em 2002), o professor de filosofia passou esse filme. Gpstei bastante na época, mas lembro de poucas coisas. Lendo este excelente review, consegui relembrar vários pontos, e fiquei com muita vontade de rever.
    Além de ter mencionado “um jovem Christian Slater”, poderia ter acrescentado “o sempre velho Sean Connery” hehehe
    Abraço

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